quarta-feira, 10 de outubro de 2007

a magia do telejornalismo

É difícil um estudante de jornalismo chegar ao momento de enfrentar o curso de telejornalismo e não ter uma sensação especial. Aparecer no vídeo, entrar na casa das pessoas, e saber que está sendo visto e ouvido por inúmeros telespectadores, é algo contagiante. Guilherme Jorge de Rezende, em Telejornalismo no Brasil, diz: “A linguagem jornalística na televisão tem um traço específico que a distingue: a imagem. A força da mensagem icônica é tão grande que, para muitas pessoas, o que a tela mostra é a realidade. Por isso, a TV ocupa um status tão elevado, o que faz com que os telespectadores, especialmente os pouco dotados de senso crítico, lhe dêem crédito total, considerando-a incapaz de mentir para milhões de pessoas”. Isso sem esquecer o perigoso glamour (?!) proporcionado pela fama, e a patente confusão entre ser jornalista e ser artista. O incalculável alcance da televisão na sociedade brasileira e o fascínio do povo por este veículo (o que lhe confere alta carga de credibilidade e responsabilidade), são fatores relevantes para o encanto do repórter (ou, pelo menos, aspirante a tal) pelo estudo do jornalismo na TV.
O primeiro dia foi de muita expectativa e ansiedade: nervosismo presente, mas contido. Se as referências da professora eram as melhores possíveis, por que tanto temor? Passando nos corredores do Centro Universitário da Bahia (FIB), ainda procurando a sala, estiquei meu pescoço (amparado pela minha boa estatura) e vi uma frase escrita em uma lousa: “tudo é difícil até se tornar fácil”. Como diz o comentarista esportivo Rui Botelho: “caiu como uma luva”. Era o que eu precisava para iniciar o curso de cabeça em prumo. Até porque, sou um preguiçoso, porém não burro! E me baseei na minha facilidade de aprendizagem para dissolver essa pré-imaginação de dificuldade, em leveza e tranquilidade.
Começando do começo, vamos falar da pauta. Sinceramente, nunca gostei de elaborar pauta, apesar de considerá-la imprescindível para uma boa matéria. Ainda mais em telejornalismo, pois desde a pauta já se deve haver uma preocupação com as imagens. Segundo Olga Curado, em A Notícia na TV, as pautas podem ser factuais: “É a cobertura. A equipe de jornalismo acompanha e registra um fato que esteja transcorrendo... oferece em poucas palavras sugestões para enfoques de cobertura”; ou produzidas: “Não é o fato já escancarado. Pauta produzida é uma pauta de investigação... O essencial que não se pode perder de vista é que o ponto de partida de uma pauta será sempre a notícia”. No curso, não seria possível elaborarmos algo factual, então foram pautas produzidas, tanto para o telejornal piloto, quanto para o “valendo”. Apesar de ter a teoria à disposição, não tive muita facilidade em levantar as pautas, devido à falta de prazer nessa atividade mesmo. Porém, na reunião de pauta, realizada na sala, trouxe minhas sugestões e uma foi aprovada e executada.
Depois de ter a pauta pronta e aprovada, chegou a hora de ir a campo. Contatar as fontes, marcar o encontro, e concretizar a entrevista. Eis outro ponto muito interessante no telejornalismo, especificamente. Até então só tinha feito matérias para o formato de impresso. Para essas matérias, o momento da entrevista com a fonte nunca foi encarado como “entrevista” mesmo. A gente ia conversando, e no decorrer da conversa, eu chegava aos pontos que me levaram até aquela determinada pessoa. Mas no telejornalismo, a entrevista é um momento chave da matéria, principalmente na captação de uma sonora. Então, ela requer alguns cuidados com maior incidência do que em outros veículos. Um bom conhecimento sobre o assunto e sobre o entrevistado e atenção para informações complementares que só vão surgir no ato da entrevista. Como dizem Luciana Bistane e Luciane Bacellar no livro Jornalismo de TV: “... o ideal é estar preparado, o que não significa ler tudo a respeito do assunto, e elaborar uma lista de perguntas, como costumam fazer os repórteres em início de carreira – que decoram o que vão indagar. Por estarem presos ao que prepararam, muitos repórteres não escutam coisas mais importantes que o entrevistado pode falar”.
A ansiedade grande de colocar em prática (fazer a matéria) os ensinamentos aprendidos em sala de aula já dava os primeiros sinais, quando percebi, de fato, que o jornalismo em TV possui inúmeras peculiaridades. Mas a forma detalhada, e não menos objetiva (o que vem dando dinamismo ao curso), com que os termos foram apresentados em sala de aula, ajudaram bastante a superar mais essa possível barreira. São muitas etapas também para a conclusão da reportagem em TV. Depois que fizemos (eu e Kikito) a sonora com a fonte principal, não anotei a fita em que estava (por imaturidade), o que já gerou um trabalho a mais lá na frente. Em seguida, mais duas sonoras de personagens (aplicando bem a técnica: lado esquerdo do cinegrafista, registrando na fita o nome da fonte, e apoiando o braço com o outro) e o grande momento: minha passagem! O momento de olhar para a câmera, decorar o texto e gravar. Pela expectativa gerada, achei que seria bem pior, mas na segunda tomada, Kikito e eu achávamos que já estava bom. Fizemos mais uma por precaução e pronto. Já foi. Um alívio!
Pior que nem tanto alívio assim: ainda tinham a decupagem, gravação do texto em off, e a edição da matéria. O mais gostoso desse curso de telejornalismo, da forma como está sendo lecionado, é o seu direcionamento prático, sempre baseado em conhecimentos teóricos. Torna até os processos burocráticos, por assim dizer, prazerosos. Só que cometi um equívoco, por ansiedade e imaturidade também: gravei o off antes de decupar as imagens, baseando-me em minha memória. Probabilidade remota de uma atividade dessas obter sucesso. Quase dito e feito. Tenho boa memória e saiu quase tudo como imaginei. O grande problema foi a primária falta de estrutura do laboratório de Rádio, Televisão e Cinema (RTVC), da FIB, que não possui uma bateria para a iluminação do cinegrafista. Como diria Boris Casoy: “isso é uma vergonha!” O trabalho de decupagem das imagens, orientado por Selma Barbosa, fiz sozinho. Um porre! Mas a edição, fiz com Samuel Santos. Diversão!
Acho válida e frutífera a forma como vem sendo conduzido o curso até aqui: o casamento ideal e em medidas interessantes entre teoria e prática. E eu não poderia deixar de citar aqui nesse relatório o momento mais surpreendente e inusitado ocorrido comigo no proveitoso curso até agora (diga-se de passagem, até agora!): o exercício-teste para apresentador do telejornal. Não acho que tenho boa fotografia. Por isso, baseado no capítulo A Pronúncia, do livro Manual de Telejornalismo, de Heródoto Barbeiro e Paulo Rodolfo de Lima, e nas aulas, e sempre atento para os momentos em que a própria professora Leila Nogueira lia algum texto feito por um colega (porque não sou bobo, nem nada!), busquei aprimorar a voz (pronúncia, dicção, entonação), já elogiada no curso de radiojornalismo. Barbeiro e Lima dizem: “A televisão é imagem, mas a fala também é essencial. Não se trata de exigir do jornalista um belo timbre de voz, mas clareza na pronúncia das palavras, respeito ao ritmo, velocidade e entonação. A leitura malfeita, com erro de pronúncia, e o vício de ‘comer letras’, principalmente o S final das palavras, podem fazer o telespectador perder o interesse pela notícia”. Os longos aplausos recebidos após a minha apresentação me deixaram lisonjeado e otimista para investir cada vez mais nesse campo que requer altas dosagens de humildade e maturidade de tão encantador: o telejornalismo.


P.S.: Esse texto foi um relatório entregue à professora Leila Nogueira, durante o curso de telejornalismo na FIB.

quinta-feira, 28 de junho de 2007

universidades ajudam na reinserção social do idoso

Além das igrejas e das alternativas de bairro, instituições de nível superior, como a Universidade do Estado da Bahia (Uneb) e as Faculdades Integradas Olga Mettig ajudam a inserir o idoso na sociedade. As instituições oferecem cursos e oficinas, cujo desenvolvimento eleva a auto-estima e melhora as relações humanas dos mais velhos. Uma recente pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou que existem 25 mil pessoas com mais de 100 anos de idade no Brasil. Esses números apontam para a necessidade do surgimento de projetos voltados ao melhor convívio social do idoso.
A Universidade Aberta à Terceira Idade (UATI) é um programa ligado a Pró-Reitoria de Extensão da Uneb. Conforme a vice-coordenadora do programa, Sônia Bamberg, os resultados são positivos. “Aqui se encerraram inúmeros casos de inibição, depressão e falta de amizades e comunicação social”, diz. Os pré-requisitos são a idade mínima de 50 anos e uma contribuição mensal de R$10,00, mas existem casos especiais. A desempregada Maria Francisca dos Santos, 47 anos, há seis no curso, devido a sua baixa renda, ficou isenta da taxa. “Depois da UATI melhorei meus problemas de saúde, não passo fome e tenho muitos amigos”, afirma. O fato de dispensar a mídia para a divulgação do programa não compromete sua demanda. “Atualmente, temos 600 alunos e mais de 300 em espera”, entusiasma-se Bamberg. Para ela, os comentários boca-a-boca surtiram efeito além do esperado. “Somos obrigados a encaminhar alguns candidatos a grupos de convivência das comunidades locais”, revela. A preferência da UATI é atender a idosos de baixa renda, residentes na região do bairro do Cabula, como a aposentada Selma Barreto, 64 anos, moradora da Engomadeira. De acordo com sua filha, a universitária Andréa Barreto, 26 anos, a principal melhoria percebida na sua mãe, após o ingresso na UATI, no ano de 2000, foi a desinibição.
As atividades oferecidas pela Faculdade Livre da 3ª Idade (FLTI), um curso de extensão universitária das Faculdades Integradas Olga Mettig, têm o objetivo de atualizar o conhecimento. De acordo com a coordenadora do programa, Maria Lúcia, a FLTI não segue padrão ou currículo determinado. “Nosso intuito é fazer o idoso descobrir novas habilidades e desenvolvê-las”, diz. Para a pedagoga, o relacionamento com pessoas da mesma geração, torna o ancião mais dócil e sociável. Ela também aponta o vazio e a solidão como fatores relevantes para a busca do idoso por grupos de apoio. “Há depressão que causa isolamento, doenças e óbitos precipitados”, afirma. Na FLTI, em 13 anos de existência, o número de falecimentos não chega a 10 alunos, em turmas de 170, em média. Outro fato considerável nos programas para a terceira idade é a predominância do sexo feminino. “Apesar da menor aptidão à solidão, o homem é, naturalmente, mais refratário a certos movimentos”, define Maria Lúcia.

domingo, 17 de junho de 2007

comprando e transando: a tradução

Ao sair do teatro, após assistir à peça Shopping and Fucking, dirigida por Fernando Guerreiro, o espectador tem a sensação de despertar de um estado de transe. A sociedade hipócrita em que se está inserido o empurra para tal. Após uma análise mais fria e sensata, é que se chega ao verdadeiro teor da proposta apresentada na obra.
Shopping and Fucking é montada a partir de um texto duro e crítico de Mark Ravenhill. Um dos mais polêmicos escritos na década passada. Com objetividade e sem meias palavras, critica ferozmente essa conjuntura humana atual, sustentada apenas pelas relações de consumo exacerbado. É como se fosse um processo de “coisificação” do homem. Tudo é “comprável”: as emoções, os sentimentos, as necessidades, os desejos.
A direção precisa e incontestável de Guerreiro dá a medida exata do espetáculo. Ele usa e abusa do sexo, não para falar de sexo, mas de consumo e dependência, questões enraizadas e inerentes ao ser humano. Outro ponto relevante foi não ter aderido à “baianização” da situação e suas peculiaridades, fugindo do ridículo. Os atores estão na média. Boa média, por sinal. Jussilene Santana, segura e flutuante é o destaque, ao lado de Celso Jr., com suas aparições surpresa, e não menos pontuais e importantes. Apenas o mais jovem e promissor ator, Emiliano D’Ávila, ainda não alcançou a precisão e tom dos companheiros.
Um carro de modelo bem antiquado é o comandante do cenário. Aliás, nada melhor do que um automóvel (apesar de chutado e mal tratado!), o símbolo mor do “capitalismo selvagem”, parafraseando os Titãs. O âmago do espetáculo é detonar o comportamento das sociedades contemporâneas, que põem em pé de igualdade as dependências humanas: sejam elas físicas ou emocionais. E o interessante é a forma de abordagem do assunto. É preciso sensibilidade, percepção e preocupação com o que acontece ao redor, para compreender o cerne da questão. O que está explícito na encenação é um grupo de pessoas balbuciantes e meio sem norte. Ávidos por sexo e drogas, e fazendo disso a base de suas vidas, os personagens de Shopping and Fucking transam e transam muito. O que talvez incomode os mais conservadores e desavisados é a riqueza de detalhes sugerida em tais cenas. Por abordar temas comuns aos seres humanos em geral, pode-se definir a peça como algo existencialista e universal. A iminente discussão sobre a realidade que ela oferece deve ser avaliada com alto grau de rigor, visto que o panorama do vale-tudo presente no mundo moderno é algo angustiante e longe de agonizar.

terça-feira, 1 de maio de 2007

os irmãos

São quatro rapazes barbudos, trajados sempre de maneira simples e comum, os integrantes do grupo carioca Los Hermanos. A maioria das suas canções tem letras que falam de amor sob uma pegada hardcore. O sucesso estarrecedor da balada-rock, Anna Júlia (inclusive e, sobretudo, no carnaval de Salvador) colocou a banda no topo do cenário musical brasileiro. Porém, esse caminho de vendagem exacerbada de discos, sem definição de público, não era o que havia de mais fascinante e aprazível aos meninos do Rio.
Após uma mudança, quase radical, de sonoridade entre o primeiro disco (Los Hermanos) e o segundo (Bloco do Eu Sozinho), percebeu-se uma redução na quantidade de fãs, mas uma fidelidade muito maior dos remanescentes.
A formação conta com Bruno Medina (teclados), Rodrigo Barba (bateria), Rodrigo Amarante (guitarra e voz) e Marcelo Camelo (guitarra e voz). Os vocalistas são os compositores da banda, que já possui quatro cd’s lançados. Entretanto, o caminho até a gravação desses discos não foi nada fácil. Houve conflitos com gravadoras e até com a imprensa que os taxavam de “geniosos” e contra a música comercial. Aos poucos, após novas apresentações em casas menores e uma espécie de recomeço, a mídia especializada compreendeu a linha musical da banda.
Em nota no seu site oficial e divulgação para toda a imprensa nacional, o grupo anunciou que, a partir deste ano, fará uma pausa por tempo indeterminado. O principal motivo alegado pelos integrantes da banda foi a necessidade de descansar e atentar para aspectos relevantes da vida social e outros interesses profissionais, sempre preteridos em relação à agenda do Los Hermanos. Foram enfáticos em afirmar que não há quaisquer desentendimentos entre os componentes e quando foram questionados sobre o possível fim do conjunto, responderam que estão entrando apenas em um hiato.
Que essa interrupção suma logo.

terça-feira, 24 de abril de 2007

programas de bolsas de estudo iniciam inscrições

Quem está interessado em bolsas de pós-graduação, deve ficar atento para os prazos. O terceiro bimestre do ano é o período em que as instituições abrem as suas inscrições. A 6ª seleção para o Programa Internacional de Bolsas de Pós-Graduação mantido pela Fundação Ford (International Fellowships Programa – IFP), está com inscrições abertas até o dia 21 de maio. Já o Programa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb), se estende até 11 de maio (até o meio-dia), para alunos que residem na Bahia.
Nas últimas cinco seleções brasileiras, o IFP já concedeu 210 bolsas. Atualmente, oferece 40 bolsas de mestrado (até dois anos) e doutorado (até três anos). No Brasil, o programa destina-se, prioritariamente, a pessoas negras ou indígenas, nascidas nas regiões Norte, Nordeste ou Centro-Oeste, ou provenientes de famílias sem oportunidades econômicas e educacionais. Outra característica da bolsa do IFP é que exige dedicação exclusiva aos estudos. “Atividade remunerada só é aceita se tiver alguma relação com o projeto de dissertação ou tese, mediante aprovação prévia”, diz a coordenadora do programa no Brasil, Ana Pinheiro. Além da bolsa de estudos, o programa apoia a participação dos bolsistas em cursos de curta duração, como de idiomas, informática e elaboração de projeto. Os pré-projetos devem estar relacionados aos campos de atuação da Fundação Ford: Formação de Recursos e Desenvolvimento Comunitário; Conhecimento, Criatividade e Liberdade; Paz e Justiça Social.
O programa completo de iniciação científica da Fapesb representa investimento de aproximadamente 13 milhões, sendo 4,5 milhões para novas bolsas, e o valor restante, para a manutenção daquelas contratadas em 2006. Quanto ao número de bolsas oferecidas de pós-graduação, tanto para visitantes quanto para residentes, o total é de 110, sendo 80 de mestrado e 30 de doutorado. A duração das bolsas também é de dois anos (mestrado) e três anos (doutorado), e requerem dedicação exclusiva.
Mais informações sobre o IFP podem ser obtidas no site
www.programabolsa.org.br, pelo email programabolsa@fcc.org.br, ou diretamente com a Fundação Carlos Chagas, pelo telefone (11) 3722-4404. Para obter mais detalhes sobre o programa da Fapesb, através do site www.fapesb.ba.gov.br, pelo email bolsas@fapesb.ba.gov.br, e ainda através telefone (71) 3116-7680.

domingo, 8 de abril de 2007

um perfume

O Cheiro do Ralo é o nome do segundo longa-metragem que o pernambucano Heitor Dhalia assume a direção. O filme mostra a história de Lourenço (Selton Mello), dono de uma loja que compra objetos usados de pessoas com dificuldades financeiras. A grande questão é o jogo perigoso e perverso que ele estabelece com seus clientes. O que se percebe na tela é o consumismo exagerado, presente no cotidiano das pessoas.
Para Lourenço tudo tem preço, de coisas a pessoas. E esse é o enfoque da trama: discutir a questão do poder, do dinheiro. Quem tem grana pode comprar tudo? Até onde vão os princípios de cada um? Mas esse processo de transformar os seres humanos em coisas é colocado em risco quando o próprio Lourenço deseja uma relação de afeto. É interessante avaliar o tom de humor, ironia e cinismo que Dhalia coloca no filme. O diretor demonstra habilidade para apresentar o dia-a-dia de Lourenço e sua vida tacanha na cidade de São Paulo.
O personagem de Selton Mello tem suas esquisitices. É obcecado pelo bumbum da garçonete do boteco que ele frequenta, vive isolado em uma casa feia, e o pior: é transtornado pelo fedor que sai do ralo do banheiro da loja que possui. Selton Mello brinda o público com uma atuação fantástica, digna de sua competência. Paula Braun, que interpreta a garçonete, revelou-se uma grata surpresa. Para dar ainda mais brilho ao longa, Lourenço Mutarelli, o autor do livro que inspirou o filme, interpreta o segurança do estabelecimento. Distante de clichês, o aroma dessa obra faz muitíssimo bem às narinas.

quarta-feira, 4 de abril de 2007

a vez dos invisíveis

O cerne da mostra de fotojornalismo Ruas Vivas é dar cara a anônimos que compõem o cenário urbano da capital baiana. Em cartaz no Memorial da Câmara Municipal de Salvador até o dia 13 de abril, a exposição apresenta 65 imagens de ambulantes, pedintes e transeuntes comuns, feitas pelos alunos do curso de jornalismo do Centro Universitário da Bahia (FIB). O trabalho envolveu mais de 50 estudantes e foi realizado entre setembro e dezembro de 2006, como atividade da disciplina Fotografia Jornalística I.
O fotojornalista Paulo Munhoz, professor e responsável pela curadoria, explica que o mote do trabalho é provocar no discente um olhar crítico sobre o mundo em que vive e convertê-lo em texto jornalístico imagético. “Alguns alunos nunca tinham caminhado pelo Centro de Salvador. Esse exercício lhes revelou que as ruas possuem vida e tramam enredos que fogem ao nosso olhar”, diz. O nome Ruas Vivas nasceu, justamente, da ideia primordial do projeto. “Transformar coadjuvantes em protagonistas, atores essenciais à vida urbana, a sua existência econômica e estética”, define a acadêmica e uma das coordenadoras da exposição, Cláudia Correia.
Realizar um trabalho fotográfico, onde os atores estão desacostumados com o papel principal, é uma tarefa árdua, mas gratificante. “Após fotografar em vários locais da cidade, como Barris e Calçada, foi divertido conversar com um mendigo e até fugir de um louco”, conta a aluna e fotógrafa Sheiliane Silva. Embora não existisse um delimitador de região, a maioria das fotos foi realizada no Centro da cidade e nas periferias. “Nos bairros, cujos moradores têm condições financeiras mais elevadas, esses personagens foram banidos. Restaram ruas assépticas e maquiadas”, explica Munhoz.
Na exposição, há imagens sob vários ângulos e concepções, que carregam seus discursos próprios, além da imagem pura. Fotos mais densas, como a de uma mulher, sentada em um banco no Campo Grande, delirando com uma chaga na perna, de Sheiliane Silva; mais leves, como a de um vendedor que cochila ao lado das bolas, feita por Clarissa Avelar; e transcendentes, como a de uma mulher negra, lavando roupas no Parque do Abaeté, acompanhada por sua filha, realizada por Cláudia Correia. Entre os visitantes da mostra, o funcionário público Edvan Miguez gostou do que viu: “São fotos que contemplam fielmente a Salvador dos esquecidos e excluídos, principalmente pelos órgãos oficiais”, comenta.

sábado, 17 de março de 2007

pimenta, tchê!

Considerada por muitos especialistas como a maior cantora brasileira de todos os tempos, a gaúcha Elis Regina (1945-1982), se estivesse viva, completaria hoje 62 anos de idade.
Suas interpretações, banhadas de vibração e técnica incontestáveis, ajudaram a revelar e amadurecer grandes compositores do nosso cancioneiro, como João Bosco, Ivan Lins, Gilberto Gil (que ela considerava seu compositor predileto), Belchior, Milton Nascimento, e só não lançou Chico Buarque porque resolveu pensar sobre o assunto: Nara Leão (1942-1989) foi mais rápida.
Ganhou o apelido de "pimentinha", devido ao seu comportamento muito agitado, o que contribuía para sua obsessão pela perfeição. Exigia muito de seus músicos e de si mesma, resultando em um verdadeiro brinde ao seu público fiel. De personalidade forte e bem definida, Elis envolveu-se com tudo de forma radical: com a música, com a política, com a vida. Tinha sempre a frase certeira, a mente afiada e propósitos firmes, o que a colocava no limiar da questão: uns a amavam, outros a odiavam.
Tornou-se conhecida nacionalmente em 1965, ao sagrar-se vencedora do I Festival de Música Popular Brasileira da TV Excelsior, defendendo a música Arrastão, de Edu Lobo e Vinicius de Moraes (1913-1980). Em seguida gravou Dois na Bossa ao lado de Jair Rodrigues, com tal êxito que nos anos seguintes foram lançados os volumes 2 e 3. Foi também ao lado de Jair que apresentou um dos programas musicais mais importantes da música brasileira, O Fino da Bossa, estreado em 1965 na TV Record.
Interrompeu uma carreira brilhante, que estava no auge, quando foi encontrada morta no quarto do seu apartamento em São Paulo, vítima de overdose de drogas, no dia 19 de janeiro de 1982. Elis Regina Carvalho da Costa gravou 27 discos, 14 compactos simples e 6 duplos, deixando, além de um legado imensurável para a música brasileira, três filhos: o produtor musical João Marcelo Bôscoli e os cantores Pedro Mariano e Maria Rita.

quinta-feira, 8 de março de 2007

público x privado: há limites?

Ontem, por volta das 21h, saí do Centro de Convenções, onde assisti à aula inaugural da FIB (aula magna). Saí contente, apesar de ter que caminhar até a entrada (ou saída, depende do ponto de vista!) do bairro da Boca do Rio para pegar o buzú, pois o tema - Universidade Nova - foi muito bem ministrado pelo seu idealizador, o reitor da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Naomar de Almeida.
Infelizmente, a discussão apresentada no título nada tem a ver com a proposta de reestruturação das universidades brasileiras, que suplica por um necessário debate, mas inicia-se justamente no momento em que entrei no ônibus. Ao registrar minha passagem e empurrar o torniquete, estranhei a ocupação regular dos assentos, exceto um par do lado direito próximo à porta de saída. Resolvi (como quase nunca faço) duvidar daquele ditado, "quando a esmola é grande, até o santo desconfia", e caminhei até o banco, crente que estava "abafando". Mais dois passos e vi a cena horripilante, mas não muito incomum aos passageiros de transportes coletivos: um vômito já ressecado, que deixou resquícios no assento e um "sopão" no chão.
Assumo que é uma descrição bem asquerosa, entretanto necessária para compreendermos a situação. Pois bem. Como o diabo corre da cruz, fugi daquele troço fedorento! Dei meia-volta e fiquei de pé mesmo, próximo ao cobrador, observando a cena, as pessoas e imaginando o que escrevo agora.
Problemas a circundar nossa sociedade são inúmeros, um deles, que parece imperceptível à maioria dos indivíduos, é a confusão entre o que é público e o que é privado. Vale frisar que é mais um problema ligado ao originador de todos os outros: falta de educação. Na minha explicação, baseada somente no meu "achismo", mas que suponho haver sentido lógico, serei bem objetivo. Há que se entender algo básico - e talvez por isso passe sem o devido crédito - que o que é de uso público não quer dizer que não tenha dono, mas que todos somos os supostos "donos".
Portanto ao usarmos algo público, devemos sempre pensar coletivamente, no outro que vem depois. Diferente de algo privado. Aí já é problema estritamente seu. Se em uma viagem, você sente um mal-estar e quer vomitar, vomite no interior do seu carro! Afinal de contas, ele é seu, particularmente seu, só seu. Faça o que quiser e arque com as consequências. Porém, a maioria não absorveu essa lógica ainda (talvez, nunca!). Muito pelo contrário! No ônibus, que apesar de pertencer a empresas privadas é de uso público, o enjoadinho de plantão não faz cerimônia: arreganha a boca e despeja sua porcariada dentro do veículo, que várias pessoas distintas usam ao mesmo tempo. Se a ânsia de vômito viesse quando essa mesma pessoa estivesse dentro do seu carro particular, sabe o que ela faria? Abriria a porta e expeliria tudo na rua.... que é pública e não tem dono.

quarta-feira, 7 de março de 2007

implantação da universidade nova carece de debate

O ensino superior no Brasil é alvo de mais uma discussão. A proposta do reitor da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Naomar de Almeida Filho, denominada Universidade Nova, vai além daquela já apresentada, desde 2003, pelo Ministério da Educação (MEC), cuja ênfase é mais política que acadêmica. O objetivo é modificar a base, visando a uma transformação radical na estrutura da arquitetura acadêmica da educação superior brasileira.
Durante a aula inaugural do Centro Universitário da Bahia (FIB), no último dia 7, às 19h30, no Centro de Convenções da Bahia, Naomar exibiu os limiares de sua moção, que possui questões inovadoras, mas deixa alguns questionamentos em aberto.
A estrutura curricular confusa, com um sistema de títulos desarticulado e numerosas qualificações são aspectos bastante peculiares do modelo curricular atual. A Universadade Nova baliza e minimiza tais problemas, porém não os resolve. No modelo presente nas universidades, o estudante pode obter uma formação superior com licenciatura ou bacharelado. Isso sem contar as habilitações, ênfases, e o mais recente diploma de tecnólogo. Há também as denominações profissionais diretas (médico e dentista, por exemplo), especialização, mestrado, MBA, e doutorado. Essa enxurrada de intitulações é maléfica para o profissional. “Há risco de isolamento intelectual e até recusa em alguns países desenvolvidos, devido à incompatibilidade dos títulos”, pondera Naomar.
A Universidade Nova tem a proposta de dar outra cara à estrutura curricular dos cursos profissionais, baseada nos dois grandes modelos mundiais: o norte-americano e o europeu. Bacharelado Interdisciplinar (BI) é a denominação que substituiria a graduação atual. O BI teria a duração de 3 anos e seria dividido por 4 grandes áreas do conhecimento: humanidades, artes, tecnologias e ciências, esta, sub-dividida em mais 5 grupos (da matéria, da vida, da saúde, da sociedade e sociais aplicadas). Para dificultar ainda mais, o BI poderá ter 3 formações (geral, diferencial e profissional) e um curso tronco, cada um com suas inúmeras especificidades e características.
Outro agravante: a proposta inova, mas não simplifica a organização curricular. O projeto idealizado pelo reitor da Ufba busca solucionar evidentes problemas no ensino superior. Precocidade na escolha da profissão é um item nulo com a implantação do BI, já que o aluno tem 3 anos para decidir-se, estando já no âmbito acadêmico. O BI também extingue a formação tecnológica-profissional e inculta, favorecendo o fomento à cultura, devido à amplitude das disciplinas oferecidas a todos os alunos. Outra questão fundamental é a flexibilização curricular. “O estudante pode construir seu currículo e evitar decepções. Isso visa a diminuir a taxa de evasão escolar que é de 40% nas universidades públicas”, diz Naomar. O reitor da Ufba considera “primitivo” o atual processo seletivo e fala em ajustes. É difícil discordar dessa rudimentariedade, entretanto não é apresentado, concretamente, o substituto do traumático vestibular, e nem como seriam as seleções internas. Outra lacuna é a exclusão das faculdades particulares (grande maioria em Salvador, diga-se de passagem) do projeto, que só prevê as instituições públicas. Não há um motivo explícito para isso. Em relação ao sucesso da aplicabilidade do projeto, há uma questão curiosa: a Universidade Nova é uma homenagem ao educador Anísio Teixeira. Na sua explanção, Naomar também cita o ex-reitor da Ufba, Edgar Santos. Juntos, formam um trio de profissionais de prestígio e todos possuem formação baseada naquele modelo da universidade de Coimbra...! Diz-se que a esperança é um risco que se precisa correr, portanto é esperar para ver.

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

mais um carnaval

Todos os anos o Carnaval de Salvador tem uma novidade. Nada programado, nada formulado ou planejado. É, simplesmente, mais um endossamento daquele velho, mas infalível ditado: “baiano não nasce, estreia”. Pois é, depois do boom do Afrodisíaco (atual Vixe Mainha) no ano passado, quem imaginava alguma surpresa em 2007? A sensação do momento atende pelo nome de Motumbá, o refrão de sua música repete incansavelmente a palavra “bororó”, e é capitaneada pelo ex-timbaleiro Alexandre Guedes. Assim funciona o vulcão do Carnaval de Salvador, sempre a derramar novas lavas.
E tem mais: após dois anos afastado (e muito burburinho), Caetano Veloso está de volta à folia de Momo. E com a corda toda. Vai liderar, ao lado de Jauperi (ex-Olodum e, recentemente, Vixe Mainha) um trio independente com nome homônimo ao novo filme de Monique Gardenberg, baseado em uma peça do Bando de Teatro Olodum, Ó Paí, Ó. Inclusive ele assina, em parceria com Davi Moraes, a composição da canção também homônima ao filme. Já está confirmada a presença do ator baiano Lázaro Ramos, que integra o elenco do longa, a ser lançado ainda em março.
O compadre Gilberto Gil tem cadeira cativa na festa, como é de praxe, com seu Expresso 2222. Entre os convidados ilustres: os carioquíssimos Lulu Santos, Toni Garrido e Sandra de Sá, e uma justa homenagem à cantora baiana Margareth Menezes. Sempre desinteressada por fórmulas musicais, que visam exclusivamente o consumo fácil, Daniela Mercury ataca – como raramente faz – de compositora e assina, em parceria com Manno Góes (do Jammil), sua canção de trabalho para este carnaval: Quero A Felicidade. Uma canção ritmada que preza o otimismo e a esperança. Após o cinema nacional, em 2006, a baiana elétrica vai vangloriar as culturas populares do Brasil neste carnaval. A homenagem será dividida por regiões. Daniela vai cantar forró, música eletrônica, e até canções ligadas ao folclore brasileiro para um baile infantil, vestida de “Nega Maluca”.
O inquieto Carlinhos Brown não fica por menos. O multiartista baiano apresenta o Baile do Bloco Parado e o Pipocão. Com o intuito de atrair o folião “família”, ele promete fazer do Museu du Ritmo (antigo Mercado do Ouro), no Comércio, um novo circuito do carnaval. De sexta a terça se apresentarão por lá, artistas como Margareth Menezes, Babado Novo, Timbalada, Zélia Duncan, Daniela Mercury, Chico César, dentre outros. Na segunda-feira de carnaval, Brown comanda seu trio independente, onde os foliões poderão usar tiaras em forma de pipoca. Mais uma alfinetada de Brown em seu constante discurso em prol da democratização do carnaval.

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2007

bom e velho frevo baiano

Quem foi o primeiro cantor de trio elétrico? A primeira pessoa a emprestar sua voz aos frevos instrumentais que eram executados nos trios elétricos, na década de 70? O cantor, compositor e instrumentista baiano Moraes Moreira, que completa 60 anos de idade este ano foi o tal. Após sua saída do grupo Novos Baianos, partiu, em 1975, para a carreira solo, dedicando-se, principalmente, ao carnaval da Bahia, cantando e colocando letras nos frevos instrumentais da dupla Dodô & Osmar, como Pombo Correio.
Em meados dos anos 80, já reconhecido e consagrado devido ao sucesso de músicas como Chão da Praça, resolveu afastar-se do carnaval por entender que a festa estava entregando-se demais à sedução comercial e perdendo a essência. Mesmo com a ausência de Moraes, o carnaval continuou. Dodô e Osmar, que há 55 anos inauguraram as tocatas, deram prosseguimento à invenção mirabolante e à adaptação do frevo pernambucano ao carnaval baiano. Aliás, o ano de 1975 foi o momento do retorno deles à festa de Momo, após longa pausa; e, quando conseguiram, enfim, gravar seu primeiro disco. O título Jubileu de Prata remetia aos 25 anos da invenção, de fato, do trio elétrico (um Ford 29, bem diferente do modelo contemporâneo). Após 40 anos de parceria musical, Dodô morreu, em junho de 1978, e deixou a cargo de Osmar levar ainda mais adiante a criação da dupla de baianos.
A partir da década de 80, surge a participação do (há tempos promissor) guitarrista Armandinho. Agora fica “Trio Elétrico Armandinho, Dodô & Osmar”. Com o passar dos anos, o trio não se fechou às novas tendências musicais e incorporou na sonoridade do conjunto a batida dos blocos afro e afoxés e músicas de outros compositores, como o cearense Fausto Nilo e o baiano Walter Queiroz.
Com a forte consolidação da chamada Axé Music, no início dos anos 90, eles pararam com o lançamento anual de discos. Em 1996, receberam uma justa homenagem de vários artistas, com a gravação de um CD, contendo grandes sucessos da dupla. Participam do projeto Moraes Moreira, Alceu Valença, Elba Ramalho, Daniela Mercury e Asa de Águia, dentre outros. Em 1997, Osmar Macedo vem a falecer. Mesmo sem a força de outrora, sob liderança de Armandinho, a família Macedo ainda mantém acesa, no carnaval da Bahia, a chama da dupla Dodô & Osmar.
P.S.: o frevo faz 100 anos hoje.